Marina Lacerda critica censura em arquivos de Epstein: 'Tapa na cara'
Vítima brasileira de Epstein critica censura em arquivos

Em uma entrevista concedida à rede britânica Sky News neste sábado (20), a brasileira Marina Lacerda, uma das vítimas do bilionário Jeffrey Epstein, expressou profunda decepção e revolta com a falta de transparência nos arquivos das investigações sobre os crimes sexuais do financiador, recentemente divulgados. A peça-chave do julgamento que levou Epstein à prisão classificou a situação como uma afronta às vítimas.

Frustração com a divulgação dos documentos

Marina Lacerda revelou que as vítimas estavam empolgadas com a expectativa da liberação dos arquivos, mas o sentimento rapidamente se transformou em choque. "Não há nada lá que seja transparente. É muito triste e decepcionante. É um tapa na cara a essa altura", desabafou a brasileira durante a entrevista. A crítica direta aponta para a censura e omissões presentes nos milhares de páginas tornadas públicas, que deixaram de fora, segundo ela, informações cruciais sobre a rede de exploração.

Jeffrey Epstein, condenado por tráfico sexual em 2019, foi encontrado morto em sua cela pouco depois da prisão, em um caso oficialmente tratado como suicídio. Ele mantinha relações com diversas figuras influentes da política, negócios e entretenimento, incluindo o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, cujo nome aparece em registros de voos ligados ao bilionário. Trump nega qualquer envolvimento nos crimes e afirma ter rompido laços com Epstein em 2004.

O papel de Marina no caso e seu relato chocante

Marina Lacerda foi fundamental para a condenação de Epstein e integrou o grupo de vítimas que pressionou o Congresso americano a aprovar uma lei obrigando o governo Trump a divulgar os documentos da investigação. Em entrevista anterior à rede americana ABC, ela detalhou a horrível rotina de abusos.

A brasileira contou que conheceu Epstein em 2002, aos 14 anos, pouco depois de se mudar para os Estados Unidos com a mãe e a irmã. A família vivia em condições precárias, dividindo um quarto no Queens, em Nova York. Marina trabalhava em três empregos quando surgiu uma proposta de trabalho que a levou ao bilionário. Os abusos se estenderam por três anos.

"A casa dele era uma porta giratória. Sempre tinha garotas. (...) Eu diria que ele tinha encontros com umas cinco a oito mulheres, talvez até mais, talvez até dez mulheres por dia", relatou. Aos 17 anos, Epstein começou a perder o interesse nela, por considerá-la "velha demais".

Questionamentos sobre Trump e a busca por justiça

A liberação dos arquivos foi marcada por idas e vindas políticas. Após o presidente Donald Trump sancionar a lei aprovada pelo Congresso para torná-los públicos, Marina Lacerda manifestou desconfiança em entrevista à agência Deutsche Welle. Ela questionou a mudança abrupta de posição do republicano, que antes resistia à divulgação.

"Nós [vítimas] temos sentimentos contraditórios... E então tivemos que parar um momento e pensar: 'Espere aí, por que ele está divulgando os arquivos de repente?' Ele os alterou?", indagou. Marina afirmou que as respostas que buscam nos documentos envolvem os "ricos e poderosos, homens influentes que estão por trás disso" e sugeriu que Trump estaria protegendo alguém.

A trajetória de Marina no caso teve outros obstáculos. Ela foi procurada pelo FBI em 2008, mas não pôde depor na época porque Epstein havia firmado um acordo judicial controverso. Somente 11 anos depois, com a reabertura da investigação, ela conseguiu prestar seu depoimento à Justiça.

A promessa de Trump durante a campanha eleitoral de 2024 de divulgar uma lista de envolvidos no esquema de Epstein nunca se concretizou de forma completa. Em fevereiro, alguns documentos foram publicados, mas a procuradora-geral Pam Bondi insinuou a existência de uma "lista de clientes" que nunca veio à tona. Posteriormente, o Departamento de Justiça americano informou que tal lista não existe nos autos, e o próprio Trump passou a chamar o documento de "farsa", irritando parte de sua base eleitoral, que cobra transparência total no caso.

A luta de Marina Lacerda e de outras vítimas segue como um símbolo da busca por accountability em um caso que envolve poder, influência e segredos de Estado, mostrando que a batalha por justiça e transparência está longe do fim.