Recorde de remo refaz rota de Hans Staden, aventureiro que escapou de canibais
Expedição recorde de remo homenageia Hans Staden

Uma expedição histórica de remo realizada entre 14 e 16 de novembro de 2025 marcou o aniversário de 500 anos de nascimento de Hans Staden, o aventureiro alemão que ficou conhecido por relatar sua captura por indígenas canibais no Brasil do século XVI.

A jornada histórica de Hans Staden

Hans Staden nasceu em 1525 na cidade alemã de Homberg e se tornou uma figura lendária após publicar "História Verdadeira e Descrição de uma Terra de Selvagens, Nus e Cruéis Comedores de Homens". Em sua segunda viagem ao Brasil, ele foi capturado pela tribo tupinambá enquanto trabalhava como artilheiro em um forte na ilha de Santo Amaro, em frente a Bertioga, São Paulo.

O cativeiro durou nove meses e Staden quase foi devorado pelos indígenas, que praticavam o canibalismo ritual com inimigos derrotados. Ele conseguiu escapar graças à intervenção de franceses que negociaram sua libertação. Seu livro, repleto de ilustrações de animais, plantas e descrições de rituais indígenas, tornou-se um clássico atemporal com traduções em diversas línguas.

A expedição moderna de remo

Para homenagear essa história, doze remadores do Clube de Regatas Bandeirante refizeram parte do trajeto percorrido pelos tupinambás que capturaram Staden. A expedição, batizada de Hans Staden 500, percorreu 250 quilômetros entre Bertioga e Paraty usando dois doubles coastal - barcos a remo olímpicos adaptados para travessias oceânicas.

A equipe era composta por quatro atletas veteranos do clube, sete jovens do time universitário (todos alunos da Poli-USP) e um atleta convidado da Canoa Juquehy. O grupo se preparou desde o início do ano sob supervisão do treinador Acácio Roberto Lemos.

Desafios no mar

A jornada não foi fácil. Os atletas enfrentaram condições adversas, especialmente no terceiro dia, quando precisaram cruzar a temida Ponta de Joatinga em Paraty, local conhecido por naufrágios históricos. Nesse trecho, as ondas de um metro de altura reduziram a velocidade dos barcos pela metade, para apenas 6 km/h.

Antonio Carlos Bonfá Júnior, responsável pelo barco de apoio, destacou: "Se as condições da Joatinga fossem um pouco piores, seria impossível ultrapassar aquele trecho". A expedição havia adiado a viagem desde julho aguardando condições meteorológicas seguras.

Os remadores trabalharam em esquema de revezamento, com trocas realizadas no mar onde atletas descansados nadavam em direção aos barcos para substituir os colegas. Muitos completaram mais de 30 quilômetros de remadas por dia, chegando ao final com as mãos calejadas de bolhas.

Um recorde esportivo e histórico

A expedição estabeleceu um recorde esportivo, sendo a primeira jornada do tipo na região a percorrer tal distância com equipamentos olímpicos adaptados. O coastal é uma modalidade relativamente nova no Brasil, mas que já está confirmada para as Olimpíadas de Los Angeles em 2028.

Além do desafio esportivo, a viagem proporcionou uma reflexão sobre as habilidades de navegação dos povos indígenas. Charles Medeiros, ex-vereador de Ubatuba e autor da Lei que criou a Semana Hans Staden na cidade, comentou: "A travessia feita com os barcos modernos, apropriados ao mar, mostra o quanto os indígenas eram habilidosos para remar grandes distâncias".

A paisagem percorrida - passando por Bertioga, São Sebastião, Caraguatatuba, Ubatuba e Paraty - ainda mantém belezas naturais impressionantes, embora muito diferente da terra que Staden conheceu. Restam apenas cerca de 10% da vegetação original da Mata Atlântica na região.

Legado cultural

A memória de Hans Staden continua viva através de diversas iniciativas. Em Ubatuba, uma rua no centro leva seu nome, enquanto esforços buscam estreitar laços entre a cidade e as localidades alemãs de Homberg e Wolfhagen. Recentemente, foi lançada uma versão em quadrinhos de sua história pelo escritor alemão Detlef Günter Thiel.

No Brasil, o relato de Staden ganhou popularidade em 1927, quando Monteiro Lobato recontou a história em "Aventuras de Hans Staden" com os personagens do Sítio do Pica-Pau Amarelo.

Para os atletas do Bandeirante, a experiência foi inesquecível. Victor "Manaus" Tavares, um dos universitários da equipe, resumiu: "O Litoral Norte de São Paulo e o litoral do Rio de Janeiro são lindos por si só. Agora, conhecê-los por uma perspectiva completamente diferente é algo que apenas o remo pode nos proporcionar".

A expedição foi patrocinada pela Autoridade Portuária de Santos, com apoio do Ministério dos Portos e Aeroportos e do Governo Federal. Um minidocumentário sobre a jornada, produzido pelo fotógrafo Pisco del Gaiso, está previsto para lançamento em dezembro.