A Polícia Federal (PF) identificou uma relação de troca de favores entre o coronel da Polícia Militar, Francisco Lisboa, e o então vereador e presidente da Câmara Municipal de Boa Vista, Genilson Costa, do Republicanos. De acordo com documentos da investigação, o militar atuava como 'homem de confiança' do parlamentar dentro da corporação, repassando-lhe denúncias sigilosas recebidas pelo sistema da PM, inclusive sobre o esquema de compra de votos que resultou na cassação do mandato de Genilson.
O esquema de vazamento de informações
Os investigadores tiveram acesso a prints de conversas por WhatsApp que comprovam o repasse de dados confidenciais. O coronel Lisboa encaminhava ao vereador alertas recebidos pelo canal de denúncias da PM, o 190. Um dos avisos mais graves, destacado pela PF, referia-se a uma denúncia de compra de votos na véspera das eleições de 2024, que tinha Genilson Costa como alvo.
A PF foi taxativa ao analisar a conduta do coronel. Em vez de tomar providências para apurar as acusações, Lisboa optou por alertar o próprio denunciado. Para os federais, isso configurava não uma simples omissão, mas uma colaboração ativa para obstruir a investigação do Estado. "Tal comunicação evidencia a tentativa de ocultar práticas ilícitas", afirma trecho do inquérito.
Cassão e indiciamento por crimes eleitorais
O mandato de Genilson Costa foi cassado no dia 20 de novembro de 2024, após a Justiça Eleitoral confirmar sua participação em um esquema milionário de compra de votos. A campanha, segundo a sentença, foi abastecida com mais de R$ 4 milhões não declarados, usados para pagar eleitores, o que configurou abuso de poder econômico e corrupção eleitoral. Ele recorre da decisão.
No dia anterior à cassação, 19 de novembro, Genilson Costa, o coronel Francisco Lisboa e outras quatro pessoas foram formalmente indiciados pela PF. A lista de crimes é extensa:
- Genilson Costa: Corrupção eleitoral, associação criminosa, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica eleitoral, transporte ilegal de eleitores, violação do sigilo do voto, violação de sigilo funcional e prevaricação.
- Coronel Lisboa: Corrupção eleitoral, violação de sigilo funcional, associação criminosa e prevaricação.
O caso agora está sob a responsabilidade do Ministério Público Eleitoral (MPE).
Tentativa de interferência pós-prisão
A investigação também detalhou a atuação do coronel Lisboa após a prisão de Genilson Costa, ocorrida no dia da eleição, 6 de outubro de 2024, durante a Operação Martellus. Segundo a PF, o militar fez movimentações para que o vereador ficasse detido no Comando de Policiamento da Capital (CPC), unidade que ele mesmo comandava na época.
Registros mostram que Lisboa chegou a pedir o contato do advogado de Genilson ao filho do vereador. Apesar dos esforços, o presidente da Câmara foi levado para a Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc). Para os investigadores, essas ações demonstram que a atuação do coronel visava oferecer vantagem e tratamento diferenciado ao aliado, estendendo-se ao período posterior à prisão em flagrante.
As defesas se pronunciaram por meio de notas. O coronel Francisco Lisboa rejeitou "de forma categórica qualquer alegação de uso de estrutura pública ou de prática de ato que tenha por finalidade beneficiar terceiros em processo eleitoral". Genilson Costa informou que ainda não foi formalmente intimado e que sua defesa se manifestará no momento adequado. A Polícia Militar afirmou que situações investigadas por outros órgãos são de responsabilidade dessas instituições.