Sistema balístico 'DNA das balas' desvenda serial killer e milícia no Brasil
Sistema 'DNA das balas' identifica serial killer e milícia

Uma tecnologia inovadora, comparada a um "banco de DNA" para projéteis, tem sido decisiva para a Polícia Civil brasileira desvendar crimes complexos. O Sistema Nacional de Análise Balística (Sinab) foi fundamental para identificar a atuação de um serial killer em grupo no Paraná e de uma milícia formada por agentes de segurança no Rio Grande do Norte. A ferramenta, que mapeia as marcas únicas deixadas por armas de fogo, já auxiliou em quase dez mil inquéritos desde que entrou em operação, em 2019.

Serial killer vestido de policial no Paraná

Entre janeiro de 2022 e janeiro de 2025, uma série de assassinatos em Curitiba e região metropolitana chamou a atenção por seguir um padrão similar. As vítimas eram abordadas por três ou quatro homens armados, em um carro com placas clonadas, vestindo roupas que imitavam uniformes policiais e usando máscaras. As execuções ocorriam no local ou após sequestro.

Investigadores da 1ª Delegacia de Homicídios de Curitiba, sob o comando da delegada Magda Hofstaetter, conduziam apurações separadas sobre os casos. O ponto de virada veio com o confronto balístico realizado pelo Sinab. O sistema comprovou que os projéteis recolhidos em seis homicídios distintos, incluindo as mortes de Marcelo Alves, Antônio Carlos Talamini, Marlon Cezar, Thiago Harold Lordani e David Boni Palevoda, foram disparados pela mesma arma: uma pistola Luger calibre 9 mm.

Essa arma está associada a Kainan Wesley, identificado pela polícia como um dos chefes do tráfico de drogas na região do bairro Abranches, em Curitiba. Ele é suspeito de ser responsável por cerca de 30 mortes e atua vestido como policial. "Foi a partir do confronto que conseguimos colocá-lo em todos esses casos, apontar a autoria e indiciá-lo em todas as situações", explicou a delegada Hofstaetter. Kainan Wesley permanece foragido e a arma, ainda não apreendida, estaria em seu poder.

Milícia de agentes de segurança no Rio Grande do Norte

No outro extremo do país, o Sinab desempenhou um papel crucial para interligar uma série de crimes no Rio Grande do Norte. Consultas ao sistema permitiram conectar 46 homicídios investigados entre setembro de 2022 e maio de 2025, na capital Natal e em municípios da região metropolitana.

As ranhuras encontradas em projéteis e cápsulas de uma cena do crime batiam exatamente com as de materiais balísticos de outras ocorrências. Todos os casos estão ligados a uma milícia formada por policiais e outros agentes de segurança, que utilizavam armas de diversos calibres, como 9 mm, .40, .45 e .380.

De acordo com o delegado Cláudio Henrique Freitas de Oliveira, da 4ª Delegacia de Homicídios de Natal, o trabalho resultou, até o momento, em três condenações por homicídio e oito por formação de milícia. "Já tínhamos uma investigação bem avançada. Quando acessamos o Sinab, começou a dar positivo para outros casos, e percebemos características similares", afirmou. Uma das armas usadas nas execuções foi apreendida e ajudou a reforçar os vínculos entre os crimes.

Como funciona o "DNA das balas"

O Sinab funciona como um poderoso banco de dados nacional. Ele armazena e compara as "impressões digitais" que as armas de fogo deixam nos projéteis e nos estojos disparados. Cada arma, devido a microimperfeições no cano e no mecanismo, imprime marcas únicas nas balas, como uma assinatura.

Quando peritos cadastram as imagens e dados de um projétil recolhido em uma cena de crime, o sistema realiza buscas automáticas, cruzando informações com todo o banco nacional. Isso permite que delegados e investigadores descubram conexões entre crimes que, à primeira vista, pareciam isolados, mesmo que ocorridos em estados diferentes.

O delegado Oliveira destacou a eficiência da ferramenta: "Antigamente, dependíamos quase de uma 'iluminação divina' para decidir comparar um caso com outro. A grande vantagem do Sinab é justamente trazer essas coincidências balísticas ao nosso conhecimento, permitindo que aprofundemos a investigação".

A parceria do governo federal com os 26 estados e o Distrito Federal mantém o sistema em operação, otimizando recursos e acelerando a elucidação de crimes violentos em todo o Brasil.