Um dia depois da aprovação na Câmara dos Deputados, as lideranças do governo no Senado iniciaram discussões sobre possíveis alterações na proposta que estabelece o Marco Legal de Combate ao Crime Organizado. Conhecido como "PL Antifacção", o projeto será analisado pelos senadores e, caso sofra modificações, retornará à Câmara antes de seguir para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Pontos críticos do projeto
Uma análise técnica interna realizada por assessores do governo no Senado identificou dois pontos principais de divergência que devem ser foco de debate entre a base governista. O primeiro trata da definição do que constitui uma organização criminosa, enquanto o segundo aborda a divisão de bens apreendidos durante investigações e processos judiciais.
Os técnicos do governo avaliam que o texto aprovado pela Câmara favorece brechas jurídicas que podem beneficiar criminosos. A proposta terá sua análise iniciada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, tendo como relator o senador Alessandro Vieira (MDB-SE).
Definição de organização criminosa
No primeiro ponto de controvérsia, os deputados aprovaram um texto que conceitua "organização criminosa ultraviolenta", enquanto o governo defendia uma definição mais clara do que são consideradas facções criminosas. O parecer técnico dos governistas no Senado afirma que a "proposta da Câmara gera confusão conceitual", o que prejudicaria a aplicação da lei.
Para os parlamentares governistas, o debate no Senado será mais "técnico", o que pode abrir caminho para mudanças defendidas pelo Planalto.
Destinação de recursos apreendidos
O segundo ponto de divergência trata da destinação dos valores retirados de grupos criminosos. O governo defendia manter a legislação atual, que favorece os fundos nacionais de segurança. No entanto, o relator Guilherme Derrite propôs, e a Câmara aprovou, uma regra que prevê a distribuição dos valores conforme a atuação das forças de segurança.
O Ministério da Justiça avalia que essa mudança levaria a uma perda de recursos para a Polícia Federal. A avaliação dos técnicos do Senado corrobora essa preocupação, alertando que o "impacto orçamentário será sentido pela Polícia Federal".
Outras fragilidades identificadas
Além desses dois pontos principais, a análise técnica da base governista identificou que o texto de Derrite enfraquece a proposta original do Planalto em outros três aspectos:
- Infiltração de colaboradores nas investigações
- Acesso facilitado de dados durante a investigação
- Coordenação da PF em cooperações internacionais
Nos relatórios iniciais, Derrite havia mantido a proposta do governo que estabelecia que, além de policiais, delatores também poderiam atuar como infiltrados em investigações contra organizações criminosas. No texto aprovado pela Câmara, essa possibilidade foi eliminada.
O relator também retirou mecanismos que o governo havia proposto para proteger a identidade de policiais que trabalharão como infiltrados. Para os técnicos do Senado, as regras sobre infiltração "estão em descompasso com a complexidade das facções atuais".
Os senadores governistas avaliam que o texto aprovado pela Câmara dificulta investigações ao não prever um procedimento ágil para que policiais e o Ministério Público acessem dados. A avaliação também indica que o texto de Derrite dificulta que a Polícia Federal coordene cooperações policiais, o que levaria a um "prejuízo do bom funcionamento da segurança pública".
O projeto segue agora para análise detalhada no Senado, onde promete gerar debates intensos sobre o melhor caminho para combater o crime organizado no país.