O promotor de Justiça Lincoln Gakiya fez um alerta preocupante durante seu depoimento à CPI do Crime Organizado do Senado nesta terça-feira (25). Segundo o experiente investigador, a polarização política no Brasil tem sido um obstáculo significativo para o trabalho integrado das polícias e do Ministério Público no combate às facções criminosas.
Disputas institucionais prejudicam investigações
Com duas décadas de experiência investigando o Primeiro Comando da Capital (PCC), Gakiya foi enfático ao afirmar que os organismos de segurança vivem "disputas institucionais" que comprometem seriamente as investigações contra o crime organizado. O promotor, que integra o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) em Presidente Prudente, São Paulo, defendeu que o Congresso e o Poder Público precisam priorizar mecanismos de cooperação entre forças de segurança.
Gakiya vive sob escolta policial há mais de dez anos devido às ameaças constantes da facção que investiga, o que confere ainda mais peso às suas declarações sobre os desafios no combate ao crime organizado.
Projeto Antifacção é insuficiente, diz especialista
Durante sua explanação aos membros da CPI, o promotor analisou criticamente o PL Antifacção, que cria o marco legal de combate ao crime organizado e já foi aprovado pela Câmara, aguardando agora análise do Senado. Embora o projeto permita a criação de forças-tarefas com participação da Polícia Federal e do MP, Gakiya considerou o mecanismo adotado insuficiente para garantir a cooperação efetiva.
"Em estados polarizados, dificilmente o governador ou o secretário vai autorizar a assinatura de um termo", argumentou o promotor, destacando que o texto atual "engessa" a integração entre as instituições.
Um dos pontos mais preocupantes levantados por Gakiya é que o projeto poderá submeter a assinatura de acordos de cooperação a autoridades estaduais que são alvos das próprias investigações, criando um claro conflito de interesses.
Falta coordenação, não legislação
O membro do Gaeco foi categórico ao afirmar que o Brasil já possui instrumentos legislativos suficientes para combater organizações criminosas. O problema fundamental, segundo sua análise, é a falta de "coordenação, integração e cooperação interna" entre as forças de segurança.
"O que percebo é uma absoluta falta de coordenação, de integração e de cooperação interna", declarou Gakiya, chamando atenção para o fato de que a Polícia Federal conta com apenas pouco mais de 13 mil policiais para atender um país continental.
O promotor defendeu o fortalecimento da PF, mas ressaltou que não se deve desprezar a força dos estados na luta contra o crime organizado.
Soluções propostas pelo especialista
Entre as soluções apresentadas por Lincoln Gakiya está a criação de uma autoridade nacional antimáfia, que poderia superar as diferenças institucionais e disputas entre polícias e Ministério Público. Esta proposta foi discutida em reuniões que embasaram o projeto antifacções enviado pelo governo ao Congresso.
O promotor também defendeu o aumento de penas para membros de grupos criminosos, que podem chegar a 40 anos de prisão conforme previsto no PL Antifacção. No entanto, fez ressalvas importantes: "Não é apenas uma alteração legislativa, com majoração das penas, que resolverá do dia para noite o grave problema".
Gakiya citou como exemplo positivo a Operação Carbono Oculto, fruto da cooperação entre Receita Federal e Ministério Público paulista, que só ocorreu devido à "proatividade dos colegas", e não por qualquer obrigatoriedade legal.
"Me parece que a polarização política, que tomou conta deste país, acaba prejudicando ainda mais essa integração", concluiu o promotor, enfatizando a necessidade urgente de mecanismos que obriguem as forças de segurança e o MP a atuarem de forma coordenada e sinérgica.