Memorial da Anistia: Justiça condena UFMG por obra paralisada
A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) foi condenada a indenizar a construtora JRN pela paralisação das obras do Memorial da Anistia Política em Belo Horizonte. A decisão da Justiça Federal, confirmada na última terça-feira (5), rejeitou o recurso da universidade e manteve a responsabilidade da instituição pelo atraso na construção do museu.
Projeto símbolo da resistência abandonado
O Memorial da Anistia Política foi concebido para preservar a memória da repressão durante a ditadura militar brasileira. Localizado no bairro Santo Antônio, região Centro-Sul da capital mineira, o projeto ocuparia o casarão do antigo Colégio de Aplicação da UFMG - um símbolo da resistência à ditadura - que abrigaria o museu, enquanto um novo edifício seria destinado a um centro de pesquisa e documentação.
Atualmente, o local se encontra em estado de degradação, com estruturas escoradas por andaimes para evitar desabamentos. A situação contrasta com a importância histórica do projeto, especialmente em 2025, quando se completam 40 anos da redemocratização do Brasil.
Sequência de problemas e investigações
A trajetória do Memorial da Anistia é marcada por uma série de contratempos:
- O projeto foi lançado em 2009 com financiamento do Ministério da Justiça
- As obras começaram em 2012 sob responsabilidade da UFMG
- A construção foi interrompida em 2016 por falta de repasses federais
- Em 2017, investigação da Polícia Federal apurou desvio de R$ 4 milhões
- Onze pessoas foram indiciadas, incluindo professores, servidores e estudantes
- Em 2019, a então ministra Damares Alves cancelou o projeto alegando falta de verba
- O inquérito foi arquivado em 2020 por falta de provas
Segundo o desembargador Marcelo Dolzany da Costa, relator do processo, "ficou comprovado nos autos que a paralisação da construção e o desequilíbrio contratual decorreram de falhas de projeto, indefinições técnicas e inadimplemento da própria administração".
Esperança de conclusão e importância histórica
Wagner Dias Ferreira, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG, acredita que o reconhecimento da culpa pode abrir caminho para a conclusão do memorial. "Essa dinâmica gerencial errada inviabilizou a construção do museu. O reconhecimento de culpa é fundamental. No futuro, será necessário mais zelo e cuidado", explicou.
Cléber Maia, ex-preso político e integrante da Associação dos Amigos do Memorial da Anistia, que sofreu 70 dias de tortura após ser preso em São Paulo por participar de um congresso estudantil, destacou a importância do projeto: "A gente não pode desconhecer a desumanidade que houve por parte da repressão. E isso só pode ser guardado por meio de uma documentação rigorosamente preservada".
A UFMG se defendeu afirmando que a decisão judicial não considera o parecer favorável do Tribunal de Contas da União sobre o uso dos recursos federais, e que os pagamentos estavam condicionados aos repasses do Ministério da Justiça. A universidade também esclareceu que seus dirigentes não foram presos em 2017, mas conduzidos coercitivamente durante as investigações.
Enquanto isso, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania informou não ser parte no processo e não ter sido comunicado oficialmente. A construtora JRN não se manifestou sobre o caso.
Com o destino ainda indefinido, o Memorial da Anistia permanece como um projeto inconcluso que simboliza tanto a luta pela memória histórica quanto os desafios da gestão pública no Brasil.