
Trinta anos. Três décadas de olhares desconfiados, de mães puxando crianças para o outro lado da rua, de moradores fazendo o sinal da cruz ao passar na frente. O prédio fantasma no coração de Itajaí finalmente está com os dias contados — e a retroescavadeira não perdoa.
Parece até cena de filme: andaimes enferrujados balançando no vento, vidros estilhaçados refletindo o sol como dentes quebrados. Aquele monstro de concreto, condenado judicialmente desde os anos 90, virou símbolo do descaso. "Era questão de tempo até desabar sozinho", comenta um vendedor ambulante que trabalha há 15 anos na esquina, enquanto mastiga um pastel meio frio.
O que deu errado?
Nos anos 80, prometiam luxo. Apartamentos de frente para o mar, o novo cartão-postal da cidade. Só esqueceram de avisar que o terreno era mais instável que político em ano eleitoral. Problemas na fundação apareceram antes mesmo da obra acabar. Quando a justiça interveio, já era tarde: 12 andares de elefante branco.
- 1989: Obra paralisada pela primeira vez
- 1994: Condenação por risco estrutural
- 2015: Pedaços de fachada começam a cair
- 2023: Última reintegração de posse de moradores de rua
O prefeito atual, que nem era nascido quando o prédio começou a ser construído, classificou a demolição como "vitória da segurança pública". Mas entre os mais velhos, o tom é outro: "Dinheiro jogado fora, deviam ter resolvido isso na marra há 20 anos", resmunga um aposentado enquanto observa as máquinas.
Operação delicada
Demolir no centro da cidade não é como derrubar barraco na periferia. A empreiteira precisou:
- Isolar três quarteirões
- Reforçar estruturas vizinhas
- Usar técnicas para minimizar poeira
- Monitorar vibrações 24 horas
Custa caro? Custa. Mas segundo engenheiros, menos que um desabamento com vítimas — que parecia inevitável. A previsão é que os trabalhos durem 45 dias, mas ninguém aqui acredita em prazos curtos quando o assunto é esse elefante branco.
Enquanto isso, os moradores mais supersticiosos já fazem planos: "Vou passar aqui no dia que acabarem, fazer uma oração. Talvez assim a maldição acabe", diz Dona Maria, dona de uma banca de jornais que há 28 anos tem vista garantida para o "predião mal-assombrado".